No Brasil, novo Plano Safra incentiva adoção de práticas sustentáveis de baixa emissão de carbono

Na agenda internacional, o mês de junho foi marcado pela realização da Conferência de Bonn sobre Mudanças Climáticas, onde negociadores buscaram avançar nas discussões sobre uma meta global de adaptação climatológica, transição justa para sociedades sustentáveis e o programa de trabalho de mitigação de perdas e danos, em preparação às decisões a serem adotadas na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP28), que será realizada nos Emirados Árabes Unidos, em dezembro.

Apesar do tímido progresso, os resultados da Conferência de Bonn pavimentaram a via para a publicação, durante a COP-28, do balanço global sobre como lidar com a emergência climática. Esse documento fornecerá a base para a próxima rodada de metas de redução de emissões dos países para 2035 e 2040, bem como de novos esforços de adaptação aos impactos das mudanças climáticas.

Conforme destacado no artigo de Rodrigo Lima1, diante da falta de consenso nas negociações relacionadas à agricultura, principalmente quanto à estruturação do Grupo de Sharm El-Sheikh – criado na COP-27 para tratar de ações climáticas de agricultura e segurança alimentar –, esta agenda setorial deverá ser retomada na COP-28.

Nesse sentido, será fundamental que os negociadores brasileiros defendam uma visão holística de agricultura de baixo carbono, desprovida de rótulos e que valorize a eficiência dos sistemas produtivos em termos de ganhos de produtividade, capacidade de adaptação, resiliência e de mitigação dos efeitos das mudanças climáticas.

Essa é a realidade da produção brasileira de café, que, em função do histórico investimento em pesquisa, transferência de tecnologias e boas práticas agrícolas, passou por um processo de intensificação sustentável desde a década de 1960, reduzindo em 55,1% a área cafeeira e ampliando em 400% a produtividade dos cafezais – um verdadeiro efeito “poupaterra”, que viabiliza a conservação da vegetação nativa dentro das fazendas.

A intensificação sustentável, com adoção de boas práticas agrícolas que regeneram o solo – como o aporte de matéria orgânica e manutenção de cobertura vegetal –, resultam em um balanço de carbono negativo de 10,5 toneladas de CO2eq por hectare de café cultivado, demonstrando uma capacidade de remover muito mais gases de efeito estufa da atmosfera em relação ao que é emitido pela produção cafeeira.

O recente Plano Safra 2023/24, lançado pelo governo federal no final de junho, reforça o incentivo à adoção dessas práticas sustentáveis na agricultura brasileira, em linha com os objetivos do Grupo de Sharm El-Sheikh de unir ações climáticas e segurança alimentar.

A política de financiamento do ano safra, que se iniciou em 1º julho, premiará os produtores rurais regularizados ambientalmente com redução de 0,5 ponto percentual na taxa de juros do custeio agrícola. Para tanto, esses produtores deverão estar com o Cadastro Ambiental Rural (CAR) analisado, indicando um dos seguintes status: sem passivo ambiental; ou passível de emissão de cota de reserva ambiental; ou em Programa de Regularização Ambiental (PRA).

Também serão beneficiados, com menor custo financeiro, os produtores que adotam práticas sustentáveis, a exemplo de certificação de sustentabilidade, produção orgânica ou agroecológica e uso de bioinsumos, pó de rocha e calcário, entre outras.

Como as reduções nas taxas de juros do custeio podem ocorrer de forma independente ou cumulativa, o produtor que preencher dois requisitos poderá ter uma diminuição de até 1 ponto percentual no custo financeiro do empréstimo. O Programa de Agricultura de Baixo Carbono, agora chamado de Programa para Financiamento a Sistemas de Produção Agropecuária Sustentáveis (RenovAgro), mantém sua finalidade de financiar práticas como a recuperação de áreas degradadas, a ampliação de sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta e a adoção de práticas conservacionistas de uso e manejo e de proteção dos recursos naturais.

A recomposição de áreas de vegetação nativa dentro das fazendas, a produção de bioinsumos e biofertilizantes, a instalação de sistemas para geração de energia renovável e outras práticas de baixa emissão de gases de efeito estufa também estão no escopo deste programa de financiamento. O RenovAgro ampliou o apoio financeiro à recuperação de pastagens degradadas, com foco na sua conversão para a produção agrícola, com a menor taxa de juros da agricultura empresarial, de 7% ao ano. Isso denota a capacidade do Brasil de suprir a demanda mundial por alimentos, fibras e energias sem a necessidade de abrir novas áreas agrícolas.

Para mensurar os benefícios ambientais dessa capacidade brasileira, o Cecafé, em parceria com o Imaflora e o Prof. Carlos Cerri (Esalq/USP), está desenvolvendo uma nova etapa do Projeto Carbono, com foco na quantificação do balanço de emissões e remoções de gases de efeito estufa da produção de café conilon no Estado do Espírito Santo. Uma das situações em avaliação é a adicionalidade de carbono em função da mudança do uso do solo, por exemplo, na transição de pastagem para o cultivo do café conilon.

Os resultados serão importantes para demonstrar que o Brasil é capaz de suprir a crescente demanda mundial por café, com sustentabilidade, sem necessidade de expandir sua fronteira produtiva, preservando florestas e contribuindo para a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas.

Marcos Matos
Diretor Geral do CECAFÉ

Silvia Pizzol
Gestora de Sustentabilidade do CECAFÉ

1: TRANSIÇÃO DA AGRICULTURA E DOS SISTEMAS ALIMENTARES A CAMINHO DA COP28, disponível em https://agroicone.
com.br/transicao-da-agricultura-e-dos-sistemas-alimentares-a-caminho-da-cop28/