Mudanças climáticas, inovação tecnológica e sustentabilidade social, com inclusão e diversidade, serão temas de destaque no Cecafé em 2024

A governança socioambiental continuará em destaque na agenda do setor café em 2024. Diversos fatores, como a necessidade de avançar em resiliência aos efeitos das mudanças climáticas, o crescimento das pressões regulatórias, que afetam toda a cadeia de fornecimento do café, e o comportamento dos consumidores, que demandam responsabilidade social e ambiental em suas xícaras, tornam a transparência nos indicadores ESG uma questão de vantagem competitiva para o acesso a mercados. A seguir, são apresentadas as principais tendências ESG para o ano de 2024 e as ações do segmento exportador, organizado no Cecafé, que contribuem para que os cafés do Brasil permaneçam na vanguarda da sustentabilidade global.

ADAPTAÇÃO E MITIGAÇÃO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS: os prejuízos decorrentes da mudança do clima têm sido reais nos últimos anos e a adoção de medidas de adaptação à nova realidade climática são fundamentais para mitigar riscos à sustentabilidade econômica das regiões produtoras e ao abastecimento do mercado de café.

De acordo com os debates mais recentes, as emissões de carbono do mundo aumentam todos os anos, impulsionadas pela expansão da China e da Índia, além de outros países em desenvolvimento. Enquanto isso, as temperaturas do globo continuam subindo e alcançando valores nunca registrados.

Segundo a Organização Meteorológica Mundial (OMM) e o observatório Copernicus Climate Change Service, da União Europeia (UE), 2023 foi o ano mais quente em relação à média do período pré-industrial, de 1850 a 1900, com alta de 0,17°C em comparação com o recorde anterior, registrado em 2016. Em relação aos níveis pré-industriais, a média foi 1,48ºC acima, sendo esse o primeiro ano em que todos os dias ultrapassaram 1°C.

Diante desse cenário, é muito importante que as políticas globais sejam tecnicamente estruturadas com objetivos de curto, médio e longo prazos e que incentivem a pesquisa agropecuária e a adoção de boas práticas. Por isso, cientistas, produtores, empresas e organizações têm se dedicado para implantar novas tecnologias que promovam uma produção em bases cada vez mais sustentáveis, com resiliência aos efeitos negativos da mudança do clima, os quais vêm sendo sentidos também pela cafeicultura brasileira.

No que diz respeito à produtividade, em 1976 o Brasil produziu 5,59 sacas por hectare. Em 2023, a produtividade foi de 30 sacas por hectare, segundo os dados oficiais da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Em comparação, se o Brasil mantivesse as bases tecnológicas dos anos 70, seriam necessários cerca de 10 milhões de hectares para o atual nível da produção, sendo o Brasil maior produtor, maior exportador e segundo maior consumidor de café do mundo.

A despeito da evolução tecnológica, que permitiu ganhos na produtividade cafeeira nas últimas cinco décadas, o país tem sido impactado pelas anomalias climáticas. O Brasil é um país continental, sendo o quinto maior do mundo em área e possuindo cerca de 36 origens produtoras de café. Dessa forma, conforme se observa no Gráfico 1, desde 2011, por exemplo, o país tem enfrentado períodos de estiagem, altas temperaturas, granizo e geadas em diferentes regiões produtoras, o que tem afetado a produção e a produtividade da cultura.

No Brasil, as discussões relacionadas à agenda do clima e resiliência dos sistemas produtivos agropecuários tendem a se intensificar, em preparação à 30ª sessão da Conferência das Partes (COP30) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC), que será realizada em território nacional, em 2025. A geração de estudos e dados, com base científica, é fundamental para comunicar aos consumidores e reguladores as boas práticas já adotadas na cafeicultura brasileira, as quais viabilizam um balanço negativo de carbono, bem como identificar oportunidades de avanços nas ações de mitigação dos impactos dos efeitos das mudanças climáticas sobre o setor, em possível conexão com o mercado de carbono.

Nesse sentido, em 2024, o segmento exportador de café, em parceria com a StoneX e a Allcot, avaliará as oportunidades e os desafios existentes nas dimensões técnica, jurídica e econômica para o desenvolvimento de um programa agrupado de créditos de carbono na cafeicultura brasileira. Também nos próximos meses, serão divulgados os resultados do balanço de emissões de GEE na produção do café conilon capixaba, um projeto do Cecafé, conduzido tecnicamente pelo Imaflora e pelo professor Carlos Eduardo Cerri, da Esalq/USP, que conta com o apoio de parceiros globais e stakeholders do Estado do Espírito Santo.

Além da aplicação nas atividades de promoção da imagem realizadas pelo Cecafé, os resultados dessas iniciativas serão fundamentais para embasar o diálogo público-privado relacionado às mudanças climáticas. E, para tanto, o segmento exportador de café será oficialmente representado pelo Cecafé na Câmara Temática de Agrocarbono Sustentável do Conselho Nacional de Política Agrícola (CNPA), do Ministério da Agricultura e Pecuária. Este fórum tem o objetivo de construir políticas para a promoção da segurança alimentar via um agronegócio produtivo, ambientalmente responsável e climaticamente eficiente.

REGULAÇÕES GLOBAIS E TRANSPARÊNCIA: é válido lembrar que, em 30 de dezembro de 2024, entrarão em pleno vigor as obrigações de devida diligência previstas no regulamento europeu antidesmatamento (EUDR). Também na União Europeia, novos avanços são esperados, no decorrer dos próximos meses, na proposta de diretiva relativa ao dever de diligência das empresas em matéria de sustentabilidade, criando impactos extraterritoriais nas cadeias de fornecimento das corporações europeias em relação à proteção ambiental e à responsabilidade social. Além disso, padrões internacionais que buscam definir ESG estão se consolidando para permitir métricas comparáveis e as multinacionais precisam se adequar às novas formas de comunicar suas ações de governança socioambiental e os impactos gerados, em uma relação direta entre transparência e atração de investimentos.

Com isso, transparência e pragmatismo se tornam palavras-chave para se referir às práticas ESG e a solução adotada pelo segmento exportador de café para compliance às exigências regulatórias internacionais estão alinhadas a essa necessidade do mercado. A Plataforma Cecafé-Serasa Experian viabiliza a realização de devida diligência na originação do café, disponibilizando informações atualizadas de 180 bancos de dados públicos oficiais brasileiros, que avaliam e monitoram questões socioambientais respaldadas pela legislação nacional. Além disso, a partir do Cadastro Ambiental Rural (CAR) e da aplicação de tecnologia de sensoriamento remoto, é possível monitorar, automaticamente, mudanças de uso do solo nas regiões cafeeiras, conforme demandado pelo EUDR. A aplicação desta ferramenta permite ganho de eficiência na realização de ações de mitigação de riscos e de apoio à regularização de fornecedores, que podem se beneficiar das oportunidades de acesso a crédito em condições diferenciadas, conforme anunciado no Plano Safra 2023/24.

INOVAÇÃO TECNOLÓGICA: os avanços na adoção de sistemas dotados de inteligência artificial e de recursos como machine learning estarão em evidência na pauta de inovação do agro em 2024. Há espaço para avançar em ganhos de produtividade, aliados à preservação ambiental, aplicando análises de dados e identificação de padrões que viabilizam maior eficiência e redução de custos na gestão das propriedades rurais. Levar mais conhecimento ao campo sobre a inteligência artificial é uma das metas para 2024, no âmbito da parceria que o Cecafé estabeleceu com a Microsoft. O Programa Produtor Informado, que já conta com sete cursos de informática, dos níveis básico ao avançado, passará a disponibilizar, nos próximos meses, videoaulas específicas sobre inteligência artificial em sua Plataforma EAD, voltada a produtores e profissionais do setor café que desejam aprimorar suas habilidades relacionadas a ferramentas digitais.

RESPONSABILIDADE SOCIAL: pressões regulatórias e a demanda dos consumidores resultam em ampliação do escopo de governança das empresas localizadas nos países importadores de café, que passam a incluir toda a cadeia de fornecimento no escrutínio quanto à adoção de boas práticas sociais. Assim, a promoção do trabalho decente e o respeito aos direitos humanos nas regiões produtoras de café é uma tendência que veio para ficar. Em 2024, a comunicação permanente sobre as boas práticas trabalhistas e capacitação de produtores e trabalhadores visando ao compliance à legislação laboral brasileira será outro eixo de atuação do Pilar de Responsabilidade Social e Sustentabilidade do Cecafé, em parceria com a Plataforma Global do Café (GCP) e o Instituto Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo (InPACTO).

Diversidade e inclusão, com foco no empoderamento feminino no setor café, será outro tema de destaque este ano. O Cecafé está estruturando novas parcerias para trabalhar o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável Nº 5 (igualdade de gênero), visando apoiar a capacitação das mulheres do café em gestão e práticas produtivas sustentáveis e, concomitantemente, promover seu bem-estar e autoconfiança. Ao promover a saúde mental e o bem-estar, aprofunda-se a conexão da dimensão humana (social) com os demais componentes da governança socioambiental setorial.

O alinhamento dos programas do Cecafé às principais tendências ESG para 2024 demonstram o compromisso do segmento exportador em atender às expectativas dos mercados mais exigentes em termos de sustentabilidade e buscar maior reconhecimento e valorização do café brasileiro por meio da verificação e da comprovação de sua conformidade socioambiental. Com foco no respeito às pessoas, ao meio ambiente e em uma governança que promove transparência por meio da rastreabilidade, os cafés do Brasil permanecem na vanguarda da sustentabilidade global.

Marcos Matos
Diretor Geral do CECAFÉ
Silvia Pizzol
Gestora de Sustentabilidade do CECAFÉ