As conclusões do mais recente *Relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, em inglês), publicado em agosto deste ano, reforçam a urgência da pauta ambiental no âmbito das agendas ESG (governança socioambiental) dos diferentes setores econômicos.

Intitulado “Mudanças Climáticas 2021: a Base das Ciências Físicas”, o relatório afirma que a mudança do clima já é uma realidade e está mais rápida e intensa, denotando os grandes esforços que a humanidade precisará empreender para evitar que o aquecimento de 1,5ºC a 2ºC na temperatura global seja ultrapassado neste século e, principalmente, para adaptar-se ao novo clima do planeta.

Os desafios climáticos e a preocupação com a pauta ambiental e de direitos humanos mobilizam as agendas regulatórias de importantes mercados para o café brasileiro em direção à descarbonização das economias e à obrigatoriedade de avaliação de riscos e diligência de critérios ESG pelas empresas.

Nesse contexto, comunicar de forma clara e com embasamento técnico-científico que as boas práticas adotadas pela cafeicultura nacional alinham a produção à proteção ambiental é estratégico para o fluxo do comércio internacional.

A União Europeia, destino de 51% das exportações brasileiras de café, deseja atingir a neutralidade de carbono até 2050 e, logo após a aprovação de sua Lei do Clima, lançou o pacote de propostas legislativas “Fit for 55”, evidenciando sua estratégia de redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE) em 55% até 2030.

Além de uma possível taxação de carbono na fronteira, sem impactos sobre o café brasileiro, o plano também prevê a revisão do Sistema de Comércio de Licenças de Emissão (CELE), que é o mais antigo do mundo e representa 90% do valor do mercado global de carbono.

Os ambiciosos compromissos europeus reforçam as expectativas de aumento dos preços do carbono nos próximos anos, um mercado em franco crescimento. Dados da consultoria Refinitiv mostram que o comércio global de carbono atingiu € 229 bilhões, em 2020, valor cinco vezes maior que o contabilizado em 2017.

Caso ocorram avanços na regulamentação do artigo 6º do Acordo de Paris durante a COP26, em novembro, um desenvolvimento ainda mais acelerado desse mercado será alcançado, com benefícios também para a agricultura brasileira, dada sua capacidade de sequestrar e estocar carbono no solo.

Mensurar a participação do café neste potencial do agro é de suma importância, tanto para a atração de recursos via financiamento verde e créditos de carbono, quanto para a promoção do consumo dos grãos nacionais, demonstrando a vanguarda e a liderança do setor no comércio global de café.

É crescente a preocupação dos consumidores e governos com a origem dos produtos e seus impactos ambientais e sociais ao longo das cadeias de valor. Nas democracias mais maduras, essa preocupação se traduz em novas legislações de due diligence (DD) obrigatória.

Em junho, a Alemanha aprovou sua Lei da Cadeia de Fornecimento, com aplicação a partir de 2023, exigindo que as empresas monitorem riscos e relatem abusos dos direitos humanos e ambientais, estendendo as obrigações de DD aos fornecedores estrangeiros.

Paralelamente, a União Europeia avança na tramitação da primeira lei regional que torna obrigatório o “dever de diligência das empresas e a responsabilidade empresarial”. O projeto de legislação é voltado a empresas que operam no mercado europeu, mas também impactando seus relacionamentos com fornecedores localizados fora da União Europeia.

Sendo o mercado europeu o principal destino das exportações brasileiras de café, o setor exportador e os demais segmentos do agronegócio café nacional devem estar atentos a esse processo legislativo, que tende a ser finalizado pelo parlamento europeu no próximo ano. A expectativa é que a nova lei entre efetivamente em vigor somente em 2023, após sua internalização pelos países membros da União Europeia.

Atento aos cenários e oportunidades que se desenham nos principais destinos das exportações brasileiras, o Cecafé desenvolve projetos para posicionar os cafés do Brasil em um mercado internacional cada vez mais exigente em relação à agenda climática, proteção ambiental e respeito aos direitos humanos.

Diante da urgência da pauta do clima, o Cecafé está desenvolvendo um projeto piloto, em parceria com o Imaflora, para quantificar as emissões e remoções de gases de efeito estufa nas três principais regiões cafeeiras de Minas Gerais, seja nas áreas produtivas, bem como nas áreas de preservação ambiental, segundo o Código Florestal Brasileiro.

No próximo mês de novembro, serão iniciadas as avaliações sobre a contribuição da cafeicultura mineira para o sequestro do carbono da atmosfera e sua estocagem no solo, nos cafeeiros e nas áreas de conservação de vegetação nativa das propriedades rurais. Os resultados serão obtidos no final de 2021 e, no próximo ano, o estudo será estendido para áreas de cultivo de café conilon.

Em linha com as exigências internacionais de responsabilidade corporativa e em conjunto com parceiros estratégicos, o Cecafé tem se engajado em ações coletivas que visam ao aprimoramento do ambiente institucional existente no país, via fortalecimento da adoção de boas práticas no campo, desenho de novas ferramentas de monitoramento das exportações e de rastreabilidade no âmbito pré-competitivo e de prevenção de riscos e suporte à proteção social.

Com foco na neutralidade de carbono do café brasileiro e nas tendências regulatórias internacionais, o Cecafé trabalha pela melhoria contínua da sustentabilidade da cafeicultura brasileira, buscando fortalecer a posição de liderança absoluta do Brasil como o principal fornecedor mundial de cafés sustentáveis e com qualidade.

Marcos Matos
Diretor Geral do CECAFÉ

Silvia Pizzol
Gestora de Sustentabilidade do CECAFÉ