Parceria entre Cecafé e StoneX Carbon Solutions demonstrou que programa agrupado de créditos de carbono é viável na cafeicultura brasileira

Em ano de COP 30 no Brasil, o Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), por meio de mais um capítulo de sua agenda de carbono, busca contribuir para as discussões sobre resiliência climática e financiamento verde para a cafeicultura brasileira.

O projeto mais recente da agenda de carbono do Cecafé foi desenvolvido em parceria com a StoneX Carbon Solutions e o Instituto Alcott ao longo dos últimos dois anos. O objetivo foi estudar a viabilidade de criação de um programa agrupado de geração de créditos de carbono a partir da melhoria contínua da adoção de práticas sustentáveis na cafeicultura.

Um programa agrupado é uma estratégia para agregar produtores pequenos e médios, além daqueles de grande porte, para gerar a escala necessária para acessar mercados e monetizar a ação climática no campo. Além disso, é uma abordagem flexível de elaboração de projeto de carbono, pois permite que novas instâncias de atividades de projeto sejam adicionadas ao longo do tempo sem revalidar o projeto inteiro.

Em colaboração com os parceiros implementadores Bourbon Coffees, Cofco Internacional, Comexim, Cooxupé, Expocacer, Exportadora Guaxupé, Minasul, MonteCCer, Pipah, Sucafina, Tristão e Unicafé, que mobilizaram cafeicultores para participação nesse estudo, foram reunidas informações de 99 fazendas nos Estados de Minas Gerais, São Paulo, Espírito Santo, Paraná e Goiás – totalizando cerca de 17 mil hectares de área cultivada com café em domínios dos biomas Mata Atlântica e Cerrado.

A metodologia envolveu coleta de dados via questionário e avaliação aprofundada em campo dos sistemas produtivos de café presentes nos cinco Estados abrangidos na pesquisa.

Foi considerada a operação do programa agrupado sob estruturas internacionais de certificação de carbono, como o Verified Carbon Standard (VCS) ou o Gold Standard (GS) e uma abordagem de Gestão de Terras Agrícolas (ALM, em inglês).

Isto é, incentivo a adoção de práticas como cobertura do solo e aporte de matéria orgânica, cultivo mínimo, integração lavoura-floresta, uso de bioinsumos, entre outras técnicas de conservação do solo, as quais resultam em redução das emissões de gases de efeito estufa e aumento do carbono orgânico do solo, aprimorando a resiliência das fazendas aos efeitos das mudanças climáticas.

Após as visitas em campo, os pesquisadores concluíram que o setor cafeeiro brasileiro enfrenta os desafios das mudanças climáticas e que muitos produtores já adotam práticas conservacionistas, como o manejo sustentável do solo, o uso eficiente da água, a aplicação racional de agroquímicos e ações voltadas à conservação da biodiversidade.

Na análise do cenário base, utilizando um modelo matemático alimentado com dados de laudos de análise de solo de 53 fazendas, entre outras informações, foram identificados estoques de carbono superiores à média do grupo (46,5 t C/ha) em diversos casos.

As diferenças entre as propriedades avaliadas revelam oportunidades, pois parte do grupo já apresenta estabilidade e qualidade do solo acima da média, enquanto outras fazendas demonstram alto potencial de incremento de carbono orgânico do solo com adoção intensiva de boas práticas.

Com isso, a modelagem permitiu identifi car três cenários, de acordo com as principais práticas adotadas em cada grupo de fazendas e respectivo potencial de remoções líquidas de carbono.

QUADRO1: CENÁRIOS DE ADOÇÃO DE BOAS PRÁTICAS NAS FAZENDAS DE CAFÉ E POTENCIAL DE REMOÇÕES LÍQUIDAS DE CARBONO

Com base nesses cenários, a equipe técnica da StoneX realizou simulações de fl uxo de caixa considerando que os processos de verifi cação e emissão de créditos ocorreriam a cada três anos, para um período de projeto de 20 anos.

O objetivo do exercício foi encontrar o tamanho mínimo do projeto que permitiria uma taxa interna de retorno de pelo menos 20%, tendo como parâmetros fi nanceiros: i) valor de crédito de carbono de 10 USD/tCO2; ii) Infl ação anual de 2%; iii) taxa de desconto de 19%; e iv) taxa de financiamento de 10%, com reserva de contingência de 2,5%.

QUADRO1: CENÁRIOS DE ADOÇÃO DE BOAS PRÁTICAS NAS FAZENDAS DE CAFÉ E POTENCIAL DE REMOÇÕES LÍQUIDAS DE CARBONO

De acordo com a simulação financeira, o Cenário 1 necessita de uma área extensa (95.600 ha) para se viabilizar e gera a menor proporção de crédito de carbono por hectare. Isso implica maiores necessidades de investimento, dependência de sistemas de MRV robustos, governança e exposição a riscos mais complexos. Portanto, não seria o mais adequado.

O Cenário 2 equilibra ambição e viabilidade operacional. Ele representa o caminho mais econômico em termos de redução de emissões por dólar investido e apresenta desafios gerenciáveis em termos de coleta de dados, governança e compartilhamento de benefícios.

Já o Cenário 3 minimiza a área necessária e simplifica a coordenação, tornando-o adequado para 9.700 ha. No entanto, oferece um impacto ambiental e socioeconômico menor (tamanho do território abrangido), com custos de transação relativos mais elevados (implementação de um protocolo de práticas agrícolas mais avançado).

Para tornar o programa mais atrativo a investidores, podem ser consideradas práticas que ainda têm um nível de adoção incipiente, como, por exemplo, os sistemas integrados lavoura-floresta. Outro ponto de atenção é que o preço do crédito de carbono é uma variável incerta. Uma maneira de reduzir esse risco é incorporar aspectos de melhoria de biodiversidade e uso racional da água que tendem a incentivar o comprador do crédito a pagar mais por ele.

O estudo conclui que é viável a implantação de um programa agrupado de créditos de carbono na cafeicultura brasileira, sendo que as próximas etapas envolveriam a definição da entidade gestora (agrupadora), o sistema de repartição de benefícios, consulta às partes interessadas, o desenho do documento de planejamento do projeto (PDD) e sua validação e registro em estruturas internacionais de certificação de carbono, como o Verified Carbon Standard (VCS), além de implantação de um sistema MRV robusto.

O potencial de remoção líquida de carbono da atmosfera observado em todos os cenários avaliados reforça que a cafeicultura é parte da solução quando se trata de mitigação das mudanças climáticas e que há oportunidades de investimento verde no setor café do Brasil, visando à ampliação da adoção de práticas sustentáveis que mais sequestram carbono do que emitem para a atmosfera.

Marcos Matos
Diretor Geral do CECAFÉ

Silvia Pizzol
Diretora de Sustentabilidade do CECAFÉ