Cargas conteinerizadas seguem acumulando prejuízos milionários devido à falta de infraestrutura adequada no maior porto da América Latina

O Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) lastima a divergência aberta entre os ministros do Tribunal de Contas da União (TCU), em votação no plenário, realizada no dia 18 de novembro, que resultou em pedido de vista, por 15 dias, e ainda mais retardação de uma solução a respeito do modelo do leilão para o terminal de contêineres Tecon Santos 10, no Porto de Santos (SP).

“É um cenário de grande lamento e perplexidade, no qual não se considera o caótico cenário logístico vivido por exportadores de cargas conteinerizadas com o esgotamento da infraestrutura no Porto de Santos. Com exceção ao ministro (Antonio) Anastasia, beira o inacreditável o que ouvimos sobre os problemas, sem a devida apresentação de dados técnicos e evidências, pautado apenas em narrativas, e o aumento do ‘custo Brasil’ decorrerem de fretes marítimos elevados”, critica Eduardo Heron, diretor técnico do Cecafé.

Segundo ele, os gargalos logísticos e o aumento dos custos se devem a diversos outros fatores, em especial à falta de infraestrutura adequada no país. “Apesar de ser o maior da América Latina e de quebrar recordes consecutivos todos os anos, o Porto de Santos possui diversos desafios que elevam o ‘custo Brasil’, como a via de descida defasada de caminhões à baixa santista – Rodovia Anchieta –, construída há mais de 70 anos, além de possuir uma única alça de acesso à área primária portuária, que vive congestionada por conta da circulação diária de 15 a 20 mil caminhões, dificultando a entrega de contêineres nos terminais”, menciona.

Em relação ao transporte interno de carga, Heron completa que ainda há grandes trechos de ferrovias inativas ou degradadas, além de outros desafios como o “direito de passagem” e bitolas distintas entre as concessionárias. “Falta, também, avançar, mais rapidamente, no transporte de cargas por hidrovias e estimar a cabotagem”, cobra.

Além disso, o diretor técnico do Cecafé recorda a existência de outros problemas regulatórios, como o desafio do PL 733/2025, que trata da nova lei de portos e seu texto inicial propõe a retirada da garantia de modicidade, o que aumentará despesas dos usuários dos portos e inviabilizará a fiscalização da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) sobre práticas abusivas.

Aponta-se, ainda, a Política Nacional do Piso Mínimo de Frete Rodoviário, tratado na Lei nº 13.703/2018, que traz preocupação com a elevação dos custos no transporte interno de carga.

“Isso evidencia que o frete marítimo é apenas um entre os vários componentes que formam o ‘custo Brasil’ e, quando se avalia todo esse conjunto de desafios, a falta da infraestrutura tem peso maior e gera muito mais impacto na competitividade do país”, ressalta.

Heron anota que as “omissões de escalas” foi outro ponto crítico que a entidade observou durante a audiência do TCU. “Se o ministro tem tanta certeza dessas omissões e irregularidades operacionais, por que as autoridades públicas não tomaram providências e fiscalizaram? Qual foi a fonte de dados utilizada para essa afirmativa? Foram conversas com especialistas? Quais as evidências? Quantas denúncias estão registradas na ANTAQ tratando das omissões das escalas? Qual a fonte oficial pública desses dados que pautam a decisão? Simplesmente essas informações não existem nos órgãos governamentais”, revela.

Ele justifica que o Cecafé conversou com diversas autoridades públicas e, notadamente, observou-se que nenhuma das instituições, seja Ministério de Portos e Aeroportos (MPor), ANTAQ, Autoridade Portuária de Santos (APS) ou o próprio TCU, possui indicadores logísticos e portuários que evidenciem tais omissões de escalas, atrasos de navios, ocupação de pátio e berço e rolagens de cargas.

“Além disso, disseram ter conversado com diversos especialistas e que ‘dezenas’ de instituições apoiavam a proposição da ANTAQ. Alguém conversou com os representantes da carga, que são os que arcam os milionários prejuízos? O café, por exemplo, não foi ouvido! Pior: o café foi ouvido pela ANTAQ, quando destacamos a urgente necessidade de oferta de capacidade de pátio/berço e manifestamos a defesa da realização do leilão amplo e irrestrito, em uma única fase, cenário que é desconsiderado nos moldes atuais, visando evitar judicializações. Não basta ouvir apenas os especialistas, precisam ouvir aqueles que estão pagando a conta”, crítica.

No que diz respeito ao citado apoio de dezenas de instituições ao modelo proposto pela ANTAQ, o diretor do Cecafé esclarece que se trata de apenas seis instituições e a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA).

No entanto, ele afirma que foi ignorado o manifesto de outras oito instituições, incluindo as presentes nos autos do processo e no painel de referência promovido pelo TCU, que representam setores que, genuinamente, movimentam carga pelo Porto de Santos, além das Frentes Parlamentares de Portos e Aeroportos (FPPA) e pelo Livre Mercado (FPLM), Instituto Brasileiro de Infraestrutura (IBI), governo do Estado de São Paulo, Prefeitura de Santos, área técnica e procuradoria do próprio TCU, Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda (SEAE/MF), Associação Comercial de Santos (ACS) e Centro Brasileiro de Estudos Estratégicos (CE Brasil/Porto Livre Brasil).

Heron recorda, ainda, que, no dia 17 de novembro, o Cecafé e a Associação Logística Brasil entregaram um manifesto, que assinam em conjunto com a Associação Nacional dos Exportadores de Algodão (Anea), Associação de Exportadores de Açúcar (Aexa) e CE Brasil/Porto Livre, aos assessores dos ministros do TCU, relatando os desafios das cargas não embarcadas, rolagens de contêineres e os atrasos de navios devido ao esgotamento da infraestrutura no Porto de Santos, que, somente em setembro deste ano, implicaram 2.848 contêineres parados sem conseguir embarque e um prejuízo logístico de R$ 9 milhões aos exportadores.

“A expectativa era apresentar a realidade que os exportadores vivem no porto santista e sensibilizar os ministros, de maneira que se sintam confortáveis, com dados reais, para entender e julgar a importância de avançar, com celeridade, na realização do leilão do Tecon Santos 10, com participação ampla e irrestrita, ressaltando a necessidade de evitar judicialização, pedidos de vistas e atrasos”, relata.

Ele lamenta, também, que o comércio exterior brasileiro, no maior porto da América Latina, carente de oferta de capacidade de pátio e berço, “tem sido achincalhado e desprezado pelas autoridades públicas”, que esquecem, conforme Heron, que as cargas que geram recordes nos portos brasileiros, também geram riquezas, emprego e renda ao país e que tal segmento deveria ser tratado como de interesse público, pautado por políticas públicas com base em indicadores, dados técnicos e evidências para tornar o Brasil mais competitivo.

“Lamentamos que o futuro do Tecon Santos 10 continue sendo pautado por narrativas infundadas e especulações, pois, não havendo dados ou evidências que comprovem tal cenário apresentado no TCU, tudo não passa de meras hipóteses, como mencionado no próprio relatório da equipe técnica do Tribunal de Contas, que visam beneficiar grupos econômicos interessados no certame, os quais não querem competição e tampouco pagar valores altos no leilão”, aponta.

O diretor técnico do Cecafé informa que a entidade seguirá trabalhando, em parceria com as demais entidades de setores que dependem de contêineres para exportação, para que os exportadores de café e todo segmento da carga conteinerizada tenham condições adequadas para embarcar no Porto de Santos.

“Tanto o pedido de vista, quanto os votos divergentes ao do relator ministro Anastasia, baseiam-se em hipóteses e especulações que visam ao favorecimento de grupos econômicos, não se constituindo em base de dados e evidências, conforme demonstrado no relatório técnico do TCU. Isso causa fragilidade ao processo e uma iminente judicialização do leilão, o que, infelizmente, aumentará os desafios e os prejuízos que o comércio exterior brasileiro vem acumulando nos últimos anos”, avalia.

Por fim, ele destaca que o ministro Anastasia já propôs uma solução para pacificar o tema da concentração de mercado no Porto de Santos, caso o vencedor seja algum incumbente com ativo no cais santista, indicando que a assinatura do contrato do certame esteja condicionada ao desinvestimento. “O Cecafé apoia integralmente a proposta do ministro Anastasia, pois resolve a preocupação manifestada pelos ministros divergentes quanto à concentração de mercado,” conclui.