Cecafé participou de missão a Bélgica e Alemanha para obtenção de insights sobre o processo de implementação do Regulamento da União Europeia
Em 22 de maio, a Comissão Europeia publicou o REGULAMENTO DE EXECUÇÃO (UE) 2025/1093, que estabelece a classificação de todos os países, incluindo os Estados-Membros da União Europeia (UE), de acordo com o nível de risco de produção das commodities abrangidas pelo escopo do EUDR não ser livre de desmatamento a partir de 31/12/2020 (produtos relacionados a cacau, café, soja, óleo de palma, madeira, borracha e gado).
Conforme disposto no EUDR, foram atribuídos níveis de risco baixo, padrão ou alto aos países, tomando como base uma série de critérios, incluindo a taxa de desmatamento e degradação florestal, o nível de expansão de terras agrícolas, tendências de produção, entre outros.
A classificação de risco define a extensão do procedimento de devida diligência que deverá ser realizado pelas empresas europeias ao longo de suas cadeias de fornecimento e das verificações de conformidade desses procedimentos pelas autoridades competentes
dos Estados-Membros da UE.
Empresas que se abastecem com produtos originários de países de baixo risco poderão realizar um processo de devida diligência “simplificado”. Elas ainda estarão sujeitas à exigência de coletar informações de seus fornecedores (incluindo geolocalização de talhões e evidências adequadamente conclusivas e verificáveis de conformidade com os critérios de legalidade e desmatamento do EUDR), mas não serão obrigadas a realizar as etapas de avaliação e mitigação de risco, previstas nos artigos 10 e 11 do Regulamento.
Em relação à extensão das verificações de conformidade que as autoridades competentes dos Estados-Membros da UE realizarão nas empresas europeias, a classificação de risco dos países impacta da seguinte forma (percentual de operadores econômicos a serem verificados): 1% para “baixo risco”, 3% para “risco padrão” e 9% para “alto risco” (para países na categoria de alto risco, as autoridades competentes também devem realizar verificações em 9% da quantidade de cada um dos produtos relevantes).
Quando analisamos o cenário para o café, incluindo nações com foco na produção de cafés especiais, o Brasil ficou acima de países concorrentes, como Vietnã, Índia, Costa Rica, Filipinas, Ruanda, Jamaica, Quênia, Iêmen, África do Sul e Papua Nova Guiné, por exemplo, que foram classificados como baixo risco.
A definição do benchmarking dos países quanto aos riscos de desmatamento era uma das etapas que a Comissão Europeia precisava definir para abrir caminho para a operacionalização do EUDR, a partir de 30/12/2025. No entanto, ainda persistem muitas dúvidas sobre como será essa operacionalização de fato, o que foi possível atestar durante a Missão “TEI Eurotrip: EUDR na Prática. Fortalecendo parcerias para cadeias de valor livres de desmatamento”, da qual o Cecafé participou a convite da Comissão Europeia, de 26 a 30 de maio.
A Missão foi organizada pela Iniciativa da Equipe Europa (Team Europe Initiative, ou TEI) para cadeias produtivas livres de desmatamento, que tem como função construir parcerias e oferecer suporte aos países parceiros, incluindo partes interessadas dos setores público e privado, visando uma transição inclusiva para cadeias de valor sustentáveis, livres de desmatamento e legais.
O Zero Deforestation Hub atua como secretaria da TEI e é hospedado pelo programa Agricultura Sustentável para Ecossistemas Florestais (Sustainable Agriculture for Forest Ecosystems, ou SAFE) da GIZ.
A Missão foi uma das atividades de extensão da TEI, com o objetivo de permitir que os parceiros da América Latina tivessem insights em primeira mão sobre a operacionalização prática do EUDR com as partes interessadas europeias.
A iniciativa reuniu 21 representantes dos setores público e privado exportador de café, soja e carne bovina da América Latina (Argentina, Brasil, Colômbia, Costa Rica, Equador, Guatemala, Honduras, Paraguai e Peru) para reuniões, na Bélgica e na Alemanha,
com autoridades e partes interessadas na implementação do EUDR.
A programação da Missão envolveu reuniões com a Comissão Europeia, autoridadescompetentes de Bélgica e Alemanha, autoridade aduaneira da Bélgica, representantes dos importadores europeus de café, soja e carne bovina, ONGs e certificadoras com atuação na UE.
Dentre as principais informações obtidas junto às autoridades competentes (ACs) da Bélgica e da Alemanha, destacam-se:
(i) As ACs buscam alinhamento e adotarão uma abordagem pragmática, pelo menos, no primeiro ano de operacionalização do EUDR, a partir da experiência obtida nos dez anos de implementação do Regulamento da Madeira (EUTR). Afirmam não haver interesse em prejudicar o fluxo de comércio, nem em reter cargas em portos. O foco está em aliviar a carga burocrática sobre as empresas europeias, mas, ao mesmo tempo, atender aos percentuais de verificação dos operadores econômicos dispostos no EUDR, de acordo com o nível de risco do país de produção da commodity.
(ii) As ACs verificarão 3% dos operadores econômicos que compram produtos dos países com risco padrão de desmatamento (como o Brasil). A cota de 3% dos operadores abrangerá múltiplos produtos (café, soja, cacau, carne bovina, madeira) e não apenas o café;
(iii) Apesar da busca por padronização de procedimentos, as ACs contam com certa discricionaridade para operacionalizar o EUDR. A AC da Bélgica se baseará nos mapas globais de cobertura florestal gerados pelo JRC a partir de inteligência artificial (baixa resolução e que interpretam áreas de café como floresta). A AC da Alemanha, em parceria com o Thünen Institute, realizará análise automatizada em nuvem do risco dos talhões de café estarem sobrepostos com áreas desmatadas ou protegidas. Nesse contexto, os operadores econômicos terão que apresentar evidências detalhadas, incluindo imagens, para justificar eventuais falsos positivos para desmatamento que sejam identificados pelas ACs durante o processo de verificação.
Esse cenário denota a importância do desenvolvimento do mapeamento do parque cafeeiro do Brasil em alta resolução, viabilizando a geração de evidências, em nível de talhões, de que os grãos são livres de desmatamento e que foram produzidos de acordo com a legislação nacional relevante para o escopo do EUDR.
A partir das experiências vivencias durante a Missão TEI, é possível concluir que o segmento exportador de café do Brasil está em estágio avançado de preparação para atendimento às demandas do mercado europeu regulado pelo EUDR. Porém, desafios existem e é fundamental a parceria com o setor governamental para enfrentá-los.
Entre eles, destacam-se: i) a validação governamental do protocolo multisetorial/bases públicas para a verificação da legalidade e desmatamento das áreas produtivas das commodities incluídas no escopo do EUDR; e ii) maior interação com autoridades competentes para reconhecimento das bases públicas brasileiras e informações que são transmitidas aos operadores econômicos europeus como evidências da legalidade da produção e de que ela é livre de desmatamento após 31/12/2020.
O EUDR é um trabalho em progresso para todos os impactados, sejam partes interessadas nos países europeus, ou nos parceiros comerciais da UE, e a interação entre os setores público e privado no Brasil é fundamental para redução da carga burocrática sobre os setores exportadores, principalmente no tocante à geração das evidências demandadas pelos importadores europeus, e para a mitigação de riscos de acesso ao mercado da União Europeia.
Marcos Matos | Diretor Geral do CECAFÉ
Silvia Pizzol | Diretora de Sustentabilidade do CECAFÉ
Deixar um comentário